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terça-feira, 26 de novembro de 2013

PERSEGUINDO A VINGANÇA – 9ª PARTE






                    Era uma manhã de domingo de junho, período seco do ano. Havia uma fraca brisa alisando as frondosas mangueiras muito frequentes naquelas bandas. Os pássaros gorjeavam entre as folhas. Bandos estridentes de Maritacas sobrevoavam as árvores. Os Anús com seu canto preguiçoso bolinavam no gramado em busca de grilos, gafanhotos e outros suculentos insetos.

                   Tião levantou bem cedo, vestiu-se e correu para frente do Posto era seu dia de folga. O velho Senhor Pedro arrumava sua tralha em um bornal, feito de saco de algodão. O velho tinha trabalhado naquela noite, porém não mostrava cansaço, já que a maior parte do seu turno este mais dormia do que vigiava. O patrão sabia disto e por conhecer o Velho a muito tempo, fazia “vista grossa” desta situação já que isto não lhe trazia prejuízo algum.  Tião sorriu, pensando que suas suspeitas concretizavam em saber que o velho dormia a noite toda no banco de frente do Posto. Porém se conformava, pois era muito tranquila aquelas paragens. E gritou cumprimentando-o com jeito galhofeiro.

                   _ Bão dia Veio, dormiu bem!!

                   O velho meio sem graça respondeu-lhe sorrindo.

                   _ Dormi de que jeito, se de madrugada na mió hora do sono, a coisa esfria. Sem conta de ocê Tião, que lá do posto da prá ouvi seu ronco. Vá ronca assim lá na casa do chapéu!!! Soltando em seguida uma alegre risada.

                   _ Vamo minino, que hoje oçe vai cume um frango feito pela minha patroa. Completou Pedro dirigindo-se a Tião.

                   Ambos se colocaram a andar atravessando a BR em direção a cidade. As estreitas e esburacadas ruas de Rosário era margeadas por pequenas casas, coberta de telhas estilo colonial. Algumas destas casas eram antigas e denunciava seu passado de bandeirantes e do garimpo de pedras preciosas. Tião imaginava quanta gente já não havia passado por aquelas ruelas. Quantas pessoas não havia morado naquelas antigas casas. Quantas não haviam ali nascidas ou até mesmo morridos. Bateu-lhe um calafrio, imaginando os fantasmas que poderiam flutuar entre aquelas moradias ao cair da noite.

                   A casa de Pedro era antiga construída com tijolos, como acusava o reboco ruído de suas paredes. Em frente havia plantas ornamentais, que demonstravam a existência de um pequeno jardim. Eram estas plantadas perto da cerca de balaústres, varavam entre seus espaços como quisessem libertar-se do pequeno cativeiro, onde floresciam.

                   Ao chegar ao pequeno portão existente na frente do jardim da pequena casa, surgiu repentina uma velha senhora, que tinha um carcomido lenço em sua cabeça, prendendo os seus brancos cabelos. Era Benedita, ou Dona Dita, como era conhecida na vizinhança, fiel esposa de Pedro. A simpática senhora saiu de dentro da casa em direção ao portão, para receber o marido e o convidado Tião. Tião pode reparar que Dita quase não mais tinha dentes na boca. Os poucos que possuía estavam destruídos carcomidos pelo tempo e cobertos por cáries e tártaros. Porém isto,  não era sinal de desleixo, mas sim de miséria, como muitos que moravam naquela cidade, alguns cujos antepassados certamente tinham o “pé na senzala”. Como todos do seu pequeno círculo de amizade. Dona Dita saiu toda eufórica com a chegada de ambos e foi logo dizendo:

                   _ Votê! Pensei que oceis não vinha mais. Vamo chegá e tomá um cafezinho.

  1.                    A velha foi em direção do marido dando-lhe um abraço. O Velho meio sem jeito, disse para a mulher apontando para o menino:

                   _ Carma véia, não se aveche, este aqui é o Tião, que trabaia lá no Posto comigo. É o piá de quem eu falei.

                   _Como vai Tião, tudo bem ?.

                   _ Vou bem Dona Dita ! E a senhora?

                   _ Tudo nas graças do nosso Senhor Jesus Cristo. Vamo chega pra dentro pra mode tomá um café. Concluiu a Velha toda sorridente.

                   E assim todos foram para o interior da pequena casa. Na sala havia um velho sofá de “napa” todo rasgado, por onde saia a estofa de enchimento. No centro da saleta havia uma mesa quadrada de madeira com quatro cadeiras em torno. Sobre a mesa uma toalha de napa xadrez de vermelho e preto e um vaso de louça com flores de plásticos. Também havia um pequeno livro de capa preta onde se lia “Bíblia Sagrada”. Na parede um retrato antigo de um jovem casal, que mais tarde Tião veio a descobrir que eram seus anfitriões. Saindo para a saleta no seu lado direito, havia um portal com cortina de pano, que vezes outra se movia com o vento, mostrando que ali era um quarto de dormir, pois denunciava a existência da cama do velho casal. Ao lado deste Portal havia outro com cortinas de tiras plásticas, ligando a sala a pequena cozinha. O piso gastos pele tempo denunciava a idade da pequena casa.

                   _ Licença Dona Dita, que vou entrando. Disse Tião à Velha Senhora.

                   _ Entra e senta, que eu vô busca um café pros dois. Disse a velha transpondo a cortina de tiras plástica em direção à cozinha, de onde exalava um doce aroma de café recentemente coado.

                   Tião sentou à mesa enquanto Pedro adentrava ao quarto para deixar sua “boroca[i]”. Não demorou muito, o velho já estava de volta, vindo a sentar-se a mesa com o menino, enquanto Dita entrava na sala com dois copos de vidro em um prato até a boca de café. Os copos eram de embalagem de massa tomate, muito usado pelas famílias simplórias desse grande país.

                   _Vão tomando enquanto ainda tá quente. Disse a Velha descansando a improvisada bandeja sobre a mesa.

                   Tanto Pedro como Tião alcançaram os copos e começaram a saborear o forte e doce café. Pedro puxando prosa com o menino perguntou-lhe o seguinte:

                   _E daí Tião, que time oçê torce ?

                   _ Ué! Torço para o Brasil como todo mundo!. Disse Tião.

                   _ Não Tião, que time ocê torce do Brasil. Num tô falando da nossa Seleção. Explicou Pedro com grande risada.

                   _Quando eu morava lá no Porto dos Gaúchos, na bera do Arinos, eu via a gauchada falá de um tar de Grêmio e Internacionar. Mais era difícil a gente ouvir o jogo pelo rádio. Uma vez e outra, eu e meu falecido pai, assitia o jogo do flamengo. Também ouvia falar muito do Timão. – Referindo  o garoto ao Corintihans Paulista, provavelmente o seu time do coração.              

                   _ Tô perguntado, porque hoje a tarde vai te jogo no rádio, e se não tivé nada para fazê, a gente escuta. Tá?!? Disse o velho ao seu visitante, querendo deixa-lo à vontade.

                   _ Tá bem ! Respondeu Tião ao velho anfitrião.

                   Enquanto conversavam, Tião podia ver pelas esvoaçantes fitas plásticas da cortina que separava a sala da cozinha, Dona Dita que alimentava o fogão de barro com gravetos de lenha, certamente buscando com mais brevidade a fervura da água onde depenaria o frango. Foi quando a velha senhora chamou pelo marido dizendo:

                   _ Pedro meu véio, prepara a faca para sangrar o frango. Não demora e a água vai ferve.

                   _ Ára véia, ôce sabe que eu não gosto muito de matá os bichinhos. Disse Pedro em seguida.

                   _ Dexá de se mole Veio, vai fazê o serviço, o que o Tião vai pensa de ôce ?!? Gostá de cume ôçe gosta ?!?

                   Tião querendo amenizar a pequena discussão surgida entre os consortes antecipou a responsabilidade pela morte da ave.

                   _ Carma pessoar, não precisa brigá, eu mato o bicho!

                   Ambos saíram rindo da sala, passando pela cozinha indo até o fundo da casa, onde havia um pequeno puxado coberto de telhas de amianto, onde encontrava-se um poço. Mais ao fundo do quintal, havia alguns pés de frutas plantados. Tinha Bananas, um Cajueiro, pés de Mamão e uma frondosa Mangueira.

                   O frango estava apeado em baixo de balaio perto do poço aguardando seu cruel destino. Tião pegou a faca que estava sobre a mesa da cozinha, pendurou a  ave de cabeça para baixo no varal estendido no quintal, e com um golpe certeiro cortou-lhe a cabeça, deixando-o se batendo pendurado esvaindo-se em sangue.

                   _ Pronto Dona Dita, agora é só depená o baita!

                   Pedro e Tião então seguiram para debaixo da sombra da mangueira onde sentaram para prosseguir com a conversa interrompida por Dona Dita.

                   Já era próximo das 10:00 horas, quando ouviu-se palmas na frente de casa.

                   _ Entra fia, vamo chegá. – Escutou-se  Dona Dita falando à menina que encontrava no portão e que naquele momento acabará se chegar.

                   Tião que estava de costa para a entrada do terreno, virou-se em seguida, para notar a bela menina que estava adentrando ao terreno. Os seus negros e longo cabelos esvoaçavam com a brisa. O jovem sentiu o seu coração disparar. Era ela, Rosilda o objeto do seu desejo. O Motivo de estar naquela casa.

                   Rosilda vestia uma saia marrom que lhe cobria os joelhos, estava com uma blusa branca com fitas vermelha bem discreta. Suas vestes era adequada a religião que professava, mas isto não importava para Tião.

                   O Coração amargurado do jovem, pela primeira vez dava sinal que também era passivo de amar. Ali não somente cabia o desejo de vingança, mas também o desejo ardente de um primeiro e ardente amor.



 CONTINUA.....


[i] Termo empregado pelos sertanejos para sacola ou mala. Mesmo que matula, bornal.

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