A
Lua já se fazia alta. O silêncio profundo da mata, vez e outra era quebrado
pelo cantar dos Curiangos. Grilos e as Pererecas faziam seu concerto lá para as
margens estreita do igarapé ou sanga como os Gaúchos outrora chamavam os
córregos naquela região. O ar estava parado, não havia sequer uma leve brisa
movendo as folhas. De repente a cadela Futrica latiu, correndo em disparada em
direção ao mandiocal.
Latiu por diversas vezes, até
que seus latidos foram sufocados por um
grunhido de dor. Depois somente o silencio. Zé Chico estranhou, o silencio da
Cadela, que não era acostumada a se render. Inicialmente Zé Chico pensará ser
um Cachorro do Mato, depois, diante do silencio da Cadela, pensou tratar de uma
Onça, que estava atrás de suas galinhas.
Levantou, calçou o chinelo
que estava ao lado da cama, em seguida alcançou a lanterna e a espingarda
cartucheira que mantinha pendurada próximo a sua cama, dizendo para a mulher:
_ Muié, vou lá fora dá uma
oiada, vê se não é uma Pintada, que pego a Futrica e agora qué cumê nossas
galinhas e já vórto. Dirigindo-se para fora da casa.
A noite estava clara, porém
mesmo assim Zé Chico, ligou a lanterna focando-a em direção ao pé de limão rosa
onde as galinhas costumavam empoleirar.
De repente o silencio da
noite foi quebrado por um alto estampido, causado por um disparo de uma
espingarda calibre 12, que acertou Zé Chico, no tórax na altura do coração, jogando-o
com o impacto contra a casa, acordando
sua mulher e filhos.
Tião e Maria levantaram imediatamente,
para ver o que estava acontecendo, e quando saíram de dentro da casa,
encontraram Zé Chico, sob uma poça de
sangue agonizando para em seguida morrer.
Mãe e filho entraram em
pânico, gritavam e choravam desesperadamente, olhando em todas as direções
vendo se viam alguém ou alguma coisa. Porém escutaram somente um barco a motor,
que acelerava o Arinos acima. Os olhos
negros do menino, agora estavam em lágrimas. Não havia mais risos ou alegria somente
medo, tristeza e revolta.
Ambos estavam aturdidos pelo
acontecido, não adiantava gritar, ou clamar por ajuda, já que o clamor e os
gritos somente seriam ouvidos pelos bichos da floresta.
Mais adiante próximo do
mandiocal, encontraram morta a cadela Futrica, que mais tarde vieram a saber,
que os pistoleiros haviam matado, com o intuito de silenciar os seus latidos de alerta.
Já estava no romper do dia,
quando a família, ou que havia restado dela, preparavam para partir. Antes
porém cuidaram, de sepultar em uma cova rasa, próximo ao limoeiro o corpo de Zé
Chico, a fim de não deixá-lo exposto aos carniceiros da Floresta.
Maria carregando a filha
menor em um braço, e uma matula de roupas em outro. O filho Tião, empunhava outras duas trouxas. Partiram em
direção a barranca do Arinos, onde encontrava-se atracado o pequeno barco que
sempre serviu de transporte para a família. Mãe e filhos caminhavam em silêncio
sem ainda entender o que havia acontecido, deixando para trás tudo que juntos
haviam construído. O local agora, tinha também vestígio de um sepulcro, onde se
via uma pequena cruz feita com restos de madeira.
O menino Tião, enquanto remava o barco rio acima, imaginava
o seu pai e a cadela Futrica, caçando na Floresta do Céu. Porém voltava a dura
realizada, ao escutar o soluço de sua mãe. Remou o dia inteiro até chegar no
ponto em que havia a estrada que os levariam a Vila do Sapecado. Já haviam
caminhado alguns minutos, quando conseguiram uma carona em um caminhão toureiro.
Ao chegar ao Sapecado, mãe e filho dirigiram-se a casa de Mariquinha, velha
conhecida da família onde se hospedaram.
No dia seguinte, a família
ainda atordoada pelo acontecido, dirigiram-se ao Destacamento Policial,
informando a tragédia. Feito os procedimentos policiais, chegou-se a óbvia
conclusão, homicídio de autoria desconhecida.
Porém mais tarde, quando Tião
retornara ao local do acontecido, acompanhando o agente policial, pode
constatar que sua casa havia sido incendiada. Tião em sua simplicidade matuta, agora homem forjado no calor da
injustiça, concluiu que quem havia matado o seu pai, havia ali retornado para
concluir o sujo serviço.
continua........
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